sexta-feira, 14 de junho de 2019

Boas férias...


Texto da semana...As Férias..



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Hoje, venho falar das férias: é o tempo delas, como se diz que é o tempo das cerejas. Outra árvore dá estes frutos, e a mesma árvore os arranca: os dias as trazem até nós, os dias as levam. Neste escoar se vai o tempo, mas enquanto as férias se aproximam tudo é desejá-las, fazer projectos, embalar ilusões. Chegado o dia, temos diante de nós um espaço vazio à espera, como uma grande sala que é preciso habitar. Que vamos pôr lá dentro? Há quem passe uns dias na terra, quem se atreva ao estrangeiro, quem conte os escudos para o toldo da praia. Há também quem não saia de casa e fique a ver, todas as horas do dia, a rua onde mora. 

Seja como for, os dias de férias ganham de repente um valor que os outros não tiveram. São dias totalmente disponíveis, à mercê da imaginação e das posses de cada qual. O tempo desligou-se da mecânica do relógio, é uma dimensão não delimitada, informe, um pedaço de barro diante das mãos que o vão modelar. 
As férias são também uma obra de criação. Não espanta, portanto, que no limiar delas um súbito temor nos intimide. Aquele intervalo entre duas representações, aquela clareira rodeada de floresta negra por todos os ahlados — que iremos nós fazer do barro do tempo? Se vamos à terra, dois dias bastam para rever as pessoas conhecidas, os sítios e a família; se passamos ao estrangeiro, que resultado tiraremos de quatro mil quilómetros em oito dias? E se vamos à praia? E se ficamos em casa? Depois, tudo são complicações: horários, refeições indigestas, noites mal dormidas, histórias velhas de família, cansaço de viagens de ida-e-volta, raiva de estar fechado. Ah, as férias. Quando elas acabam, ficam-nos umas lembranças desmaiadas, como de um sonho antigo. Nada aconteceu como tínhamos imaginado: choveu, veio uma dor de dentes, os museus eram muitos, as paisagens não eram tão belas como as fotografias delas, gastou-se muito dinheiro — ou não houve sequer dinheiro para gastar. E recomeça-se o trabalho em rigoroso estado de cólera, porque pior do que ter tido e não ter já, é ficar aquém do que se sonhou. 

No fundo, esse sonho, vezes e vezes renovado e outras tantas frustrado, é apenas o desejo inconsciente de repetir as únicas férias maravilhosas que já tivemos: as da infância — esses infinitos meses para os quais não havia projectos, porque então não os fazíamos e porque, mesmo antes de vividos, já eram realização. O mundo estava todo por descobrir — e o mundo cabia no círculo que os olhos traçavam. Duas árvores e um charco: a Europa. Um caminho entre rochedos: a América. Ou a Ásia. Ou a África. Nadar ou navegar no rio era o mesmo que atravessar o oceano. E descobrir um ninho abandonado valia bem a caverna de Ali Babá. Por isso, hoje, as férias não podem ser repouso. Queremos, à viva força, descobrir o mundo, como se fôssemos nós os primeiros: outra coisa não significa a nossa satisfação quando obrigamos um amigo a confessar que não viu, no Louvre, aquela estátua grega que, no nosso entender, vale a viagem. 

Tudo isto são ilusões. O mundo está visto e decorado. Ninguém descobrirá a Europa, e a estátua grega, afinal, é uma pobre cópia romana. Mas que importa? Aqui solenemente declaro que, este ano, as minhas férias serão, em valor de revelação e descoberta, iguais àquelas em que, com os olhos novos da infância, me aconteceu encontrar uma fonte que ninguém conhecia. E se este ano não for, será para o ano. Porque a fonte lá está. 


José Saramago, in 'Deste Mundo e do Outro' 
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terça-feira, 11 de junho de 2019

TIC clique a clique

Já temos uma nova publicação "TIC clique a clique" disponível.
Consulta periodicamente este blog para teres mais informações sobre algumas ferramentas muito úteis para usar no dia a dia.
Desta vez apresentamos o PADLET.



sexta-feira, 7 de junho de 2019

O que andas a ler?



A escola do futuro..visões..



Texto da semana..Começo e Fim...


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Não basta começar bem, não adianta mediar bem; de pouco servem bons começos e melhores meios, se os fins não se mostram bem sucedidos. 
(...) Uma vez começadas, as coisas não devem ser esquecidas nem deixadas antes de ser acabadas, pois é sinal de pouca prudência começar muitos actos e não acabar nenhum. 

Mateo Alemán, in "Guzmán de Alfarache" 

terça-feira, 4 de junho de 2019

A larva ..


Texto da semana...O Português..Augustina Bessa Luís..

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Prefere ser um rico desconhecido, a ser um herói pobre. É melhor do que parece. O homem português é dissimulado, e fez da inveja um discurso do bom senso e dos direitos humanos. 
Mas é também um homem de paixões moderadas pela sensibilidade, o que faz dele um grande civilizado. 
Gosta das mulheres, o que explica o estado de dependência em que as pretende manter. A dependência é uma motivação erótica. 
É inovador mas tem pouco carácter, como é próprio dos superiormente inteligentes, tanto cientistas, como filósofos e criadores em geral. 
Mente muito, e a verdade que se arroga é uma culpa inibida. Vemos que ele se mantém num estado primitivo quando defende a sua área de partido, de seita e de família, à custa de corrupções e de crimes, se for preciso. 
Gosta do poder mas não da notoriedade. Não tem o sentido da eternidade, mas sim o prazer da liberdade imediata. Não é democrata; excepto se isso intimidar os seus adversários. 
Não tem génio, tem habilidade. 
É imaginativo mas não pensador. 
É culto mas não experiente. 
Não gosta da lei, porque ela desvaloriza a sua própria iniciativa. É místico com a fábula e viril com a desgraça. 
Admira mais a Deus do que tem fé Nele. 

Agustina Bessa-Luís, in 'Caderno de Significados' 

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Morreu Augustina Bessa Luís..

"Nasci adulta e morrerei criança", dizia Agustina Bessa-Luís



"Imprimia às palavras um fogo devorante, não pelo que elas significavam, mas pela sua escolha e aliança especial." O que Agustina escreveu em "Fanny Owen" podem aplicar-se à escritora.

Miúdos a Votos

Depois de conhecidos os resultados da iniciativa «Miúdos a Votos: quais os livros mais fixes?», que acabou em festa na Fundação Calouste Gulbenkian, partilhamos aqui algumas notícias da festa de revelação dos resultados da Iniciativa «Miúdos a Votos: quais os livros mais fixes?»: